Ternura radical
Um dos temas que mais gosto de ganhar
tempo matutando até o sem fim é a América Latina. Pensamento, arte, afeto,
terra, poesia, lirismo, movimento, suas mil formas de resistência, enfim os muitos
concavos e convexos (e tudos ai no meio disso) de Nuestra América. E dessas
matutações uma das coisas que tenho percebido cada dia mais é como aconvivência
de extremos em um mesmo espaço, corpo, símbolo é um aspecto que atravessa nossa história.
Povos extremamente diferentes, línguas, costumes, geografias e humanidades
muito distintas. Tudo isso forjado por uma extrema violência colonial. E por
mil formas de resistência e alternativas a essas dominações todas. Asi és.
Experiências muito distintas e radicais convivendo, se penetrando, sendo o
mesmo. É nóis na Pachamama.
Daí um outro tema que atravessa essa minha pensação é o patriarcado próprio daqui né.
Entronque patriarcal como chama a amiga boliviana Julieta Paredes , ativista do
feminismo comunitário. Heteropatriarcado
como vi Angela Davis dizer outro dia. Um patriarcado de múltiplas origens
(africano, indígena, euroocidental, árabe) que nojentamente se articula por
aqui em lógicas e ações específicas.
Tudo isso pra dizer que vi um vídeo
outro dia que me impressionou muito. Chama-se ternura radical contra el sistema patriarcal. Quem postou foi uma
feminista Argentina, Dani, que tava oferecendo uma oficina com esse nome.
Segundo ela explica no vídeo, desenvolveu essa idéia de ternura radical a
partir da necessidade de criar formas de trabalhar a violência radical do
patriarcado no continente.
Segundo ela, é preciso pensar espaços
distintos para distintos objetivos. A luta política no espaço público, o ato de
tomar as ruas e de participar de espaços deliberativos pede contorno e práticas
diferentes dos espaços onde vai se cuidar do estilhaçamento subjetivo, corporal
e afetivo do patriarcado na vida das pessoas. Há níveis da experiência que
precisam de formas de cuidado específicas. Experiências que necessitam de uma
ternura radical. Muito lindo.
Outra coisa muchísimo interessante (com
aciento argentino) que ela afirma é como o ideário fala-escuta - que nós psicólogos
prezamos tanto (estamos presos?)- é
insuficiente pra trabalhar essas vivências, para cuidar da “caixa de pandora “
que se abre quando se toca em determinadas experiências. Nesse sentido, aponta
Dani, é preciso trabalhar a dimensão do corpo e da política pela arte, pelo
teatro e formas que transcendam o “nomear” da violência vivida. Dai a proposta
do cuidado entre corpos e da ternura radical como caminho. Tô impressionado
pela simplicidade e força dela falando. Direto ao ponto, com força e leveza. Lindo, potente.
No que pude ver, a maioria das pessoas da oficina são
mulheres. Mas vi ali uns três homens. Um deles estava inclusive no centro,
fazendo uma das vivências. Gritava muito. Impactante. Só de ver já imaginei e só
de imaginar já fiquei meio assim. É visivelmente intenso. Os varones antipatriarcales de Córdoba que conheci tem um pouco
essa pegada também;
Para tocar nas questões mais
delicadas do patriarcado heterogêneo en
Nuestra America, é preciso não perder a ternura. Mas, se ela anda meio
perdida, ou adormecemos ela em algum canto, é preciso trazê-la de volta. Pelo
corpo, pela política, pelas viagens aos recônditos escondidos e também pela
palavra. A palavra é mais um dos elementos. Hay otros e a Dani explica isso
muito bem também. O videozinho é porreta viu. Muchísimo potente.
Isso em quatro minutos no you tube.
Imagina fazendo. Que baguio loco. Fiquei na sede aqui. É nóis na Pachamama,
suas força, suas raízes, sua ternura.
Sua radical ternura.
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